segunda-feira, 19 de novembro de 2012



Dada a importância do artigo do Dr.Paulo Brossard, hoje, em Zero Hora, não poderia deixar de divulgá-lo aos meus pazados leitores.
 
PRESÍDIO - ASSUNTO DO DIA
Suponho esteja
comigo de acordo
o ilustre ministro
que deixou de
aplicar mais de
R$ 250 milhões
em área carcerária
PAULO BROSSARD*
O assunto do dia refere-se aos presídios, depois que o ilustre ministro da Justiça declarou que preferia a morte a, se condenado, ter de cumprir pena em uma das nossas cadeias. A declaração, em termos absolutos, foi pública e solene. Era natural que repercutisse como nenhuma outra que tenha sido feita pelo mesmo ao longo de quase dois anos; sua declaração foi objetiva e não podia deixar de ressoar no estrangeiro; mas ainda estava por acontecer alguma coisa mais chocante: para trazer os "presídios medievais" aos tempos de hoje, a lei orçamentária vigente consigna ao Ministério competente R$ 312,4 milhões, dos quais foram gastos apenas R$ 63,5 milhões, deixando no desvio, por conseguinte, nada menos que R$ 258 milhões. E agora, José? Mais de R$ 250 milhões deixados sem aplicar em presídios enquanto estes permanecem em condições "medievais". Muitas coisas poderia dizer a respeito desse quadro inacreditável, mas prefiro ficar na simples enunciação dos fatos, uma vez que ela fala por si mesma e estigmatiza a autoridade relapsa ou o governo leniente. Como foi divulgado, com a verba deixada a mofar poderiam ser construídas oito prisões que não seriam "medievais", sem falar na adequação física das penitenciárias, na liberdade vigiada por monitoramento eletrônico e na construção de novos estabelecimentos penais nos Estados, quando todos, menos o Piauí, têm excesso de presos e falta de vagas. Enfim, estamos em uma situação que se diria esquizofrênica.
Passando das instalações materiais ao funcionamento das prisões, não ignoro suas deficiências, a começar pelo elemento humano, dado que a população carcerária carrega consigo uma condenação e cada um de seus componentes tem a sua queixa e sua revolta; também não é fácil selecionar os funcionários que devem atuar dia e noite em todos os variados setores de uma prisão; a própria proximidade entre as duas comunidades, a despeito das grades que as separam, não impede uma ou outra situação indesejável; por fim, os governantes também têm sua quota de responsabilidade, uma vez que fazer uma prisão, por melhor que seja, não consagra um administrador, ao passo que erguer um hospital, escola, estádio esportivo, ou mero chafariz na praça, será mais lembrado do que uma prisão ainda que pós-medieval.
A propósito, na presidência Sarney, seu ministro da Justiça, depois de sumário levantamento acerca da situação carcerária de cada Estado, levou ao presidente plano modesto, dadas as condições difíceis do erário, que consistia em fazer o mínimo, um presídio em cada Estado, e em cada Estado foi feito um; era pouco? Sem dúvida, era o mínimo, mas ao tempo também era o possível, e devia ser o primeiro passo. Parece que o plano não teve continuidade, pois, caso contrário, passado um quarto de século, a situação carcerária teria de ser outra. Se o ilustre ministro atual, pelos infortúnios da vida viesse a ser condenado, não digo que encontrasse conforto na cela que o abrigasse, mas pelo menos, não poderia repetir o que vem de proclamar acerca dos "presídios medievais". A verdade é que, por mais bem concebida e construída que venha a ser uma prisão, não creio que seja aprazível a quem tenha de hospedar-se nela obrigatoriamente anos a fio. Neste passo, pelo menos, suponho esteja comigo de acordo o ilustre ministro que deixou de aplicar mais de R$ 250 milhões em área carcerária de que fora feito zelador nacional.
*Jurista, ministro aposentado do STF
 

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