TRISTE NATAL
Recebi uma carta que me comoveu a
medida em que ia lendo seu conteúdo. Era
de um leitor que contava sua triste história vivida na noite de Natal há 70
anos passados . A gente acha que todos são felizes no Natal, mas não é verdade.
Aliás, era para ser uma noite de luz, de alegria, felicidade, união, família
reunida. Mas, para este missivista, não!
Vou deixar que ele mesmo conte a sua
frustração e a sua tristeza quando chega
a noite de Natal.
"Tinha eu seis anos de idade. Minha
saudosa mãe, sempre ao se aproximar o Natal, com esmero e prazer, enfeitava a
sala da nossa casa com o tradicional pinheirinho adornado com dezenas de bolas coloridas. Ao pé da árvore,
muito musgo, o presépio com o Menino Jesus, Maria, José e algumas vaquinhas,
tudo em gesso.
Naquele tempo não havia os efeites
eletrônicos, luzes multicores, pisca-pisca etc. Eu lembro que para completar a
ornamentação do pinheirinho, íamos caçar vagalumes para colocá-los na árvore.
As noites, como hoje, eram quentes e os vagalumes coloriam com seu pisca-pisca a
praça em frente a nossa casa, portanto era fácil apanhá-los.
Ainda debaixo do pinheirinho, mamãe
usava um espelho para representar um lago e os caminhos eram feitos com areia.
Por esses caminhos andavam os três Reis Magos . Seus
nomes seriam Melchior, rei da Pérsia; Gaspar, rei da Índia,
e Baltazar, rei da Arábia, os Santos Reis, porque são
considerados bem-aventurados. Eles ganharam estas denominações cerca de
oitocentos anos após o nascimento do Messias.
A cada dia, a partir do Natal, até a
festa dedicada a eles 5 de janeiro, dia em que são desarmados os presépios e, por conseguinte, são retirados
todos os enfeites natalícios, todas as manhãs mamãe apanhava-os e avançava com
eles até chegar próximo ao estábulo encerrando a comemoração natalícia de
Jesus.
Até então, tradicionalmente, era assim
comemorado o Natal em nossa casa.
Esqueci de dizer que meu pai era
alcoólatra. E por causa da bebida sofríamos todos nós. Nunca antes ele havia se
invocado com a árvore de Natal. Pois nessa noite meu pai tomado pela bebida e com aversão e odiosidade, joga pela janela o
enfeitado pinheirinho. Desse dia em diante nunca mais teve árvore de Natal em
minha casa. Foi o Natal mais triste de minha vida. Por isso, quando se
aproximam as comemorações natalinas em vez de me alegrar como milhões de
pessoas que se abraçam, trocam presentes, desejam uns aos outros felicidades,
cantam e reverenciam o nascimento do Menino Jesus, eu me recolho (rezo sim) mas
não comemoro.
O Natal pra mim é a lembrança triste de
uma criança frustrada por ver a sua árvore cheia de sonhos e ilusões jogada
pela janela. Mesmo que quisesse esquecer a cena profundamente
desagradável, repulsiva, de horror grandioso, não consigo. Ela me marcou
profundamente.
Miguel de Cervantes Saavedra , romancista,
draumaturgo e poeta castelhano, autor de Dom Quixote, um clássico da literatura ocidental, sobre a
tristeza disse:
"As tristezas não foram feitas para os
animais, mas para os homens; se os homens as sentem muito, tornam-se
animais." Por isto, ás vezes eu me torno um animal".
É... nem todos, realmente, são felizes
na noite de Natal!
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