A desembargadora Maria Cristina Schaan
Ferreira, plantonista da 1ª Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Regional
do Trabalho da 4ª Região (RS), decidiu nesta tarde de domingo, permitir os piquetes criados pelos rodoviários
de Porto Alegre para impedir que seus colegas furem a greve.
Para o leigo fica difícil entender, como um juiz decide de uma
forma e outro juiz de maneira contrária. A verdade é que quem está pagando essa
alta conta por um serviço considerado essencial é a população. Até quando?
Confira o texto da decisão:
Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato que, nos
autos do interdito proibitório n. 020130-57.2014.5.04.0010, deferiu a liminar
requerida para determinar "a suspensão da prática de todos os atos que
estão a molestar a posse legítima das empresas representadas pelo autor, com a
retirada dos piquetes das portas/portões das garagens das empresas de ônibus,
de modo a permitir a saída dos ônibus das garagens, no prazo de 48 horas a
contar da intimação desta decisão, sob pena de, se necessário for, ser
determinada a utilização de força policial para assegurar o direito das
empresas representadas pelo autor e o respeito à ordem jurídica" bem como
para fixar "multa de R$100.000,00 em favor do autor por dia de
descumprimento da presente decisão, sem prejuízo de haver determinação para que
a decisão seja cumprida com utilização de força policial."
O impetrante discorre acerca das razões que levaram ao movimento
paredista. Transcreve a decisão objetada na presente ação mandamental e alega
que afora vaga alegação de vandalismo, não há qualquer comprovação ou mesmo
indício do uso de violência ou força pelos grevistas. Invoca o disposto no
artigo 678, I, e 865 da CLT, bem como o artigo 30, letra "e" do
Regimento Interno deste Tribunal, para sustentar a incompetência da autoridade
dita coatora para exame da matéria que culminou no ato atacado. Sustenta que a
greve é um direito constitucionalmente assegurado, mas fundamentalmente um fato
social. Afirma que o piquete é da essência da greve e reconhecido em lei, destinado
a transmitir a toda a categoria a decisão amplamente majoritária de fazer a
greve. Aduz que, enquanto a assembleia não votar pelo fim da greve, é direito
dos grevistas continuar na frente das empesas para assegurar que a maioria
continue a prevalecer. Diz não ser factível escudar na vontade da minoria o
desrespeito à vontade de toda a categoria. Afirma que nada pode ser invocado
para garantir que os poucos que querem trabalhar possam fazer ir por água
abaixo o trabalho da grande maioria que quer permanecer parada, muito menos a
polícia. Argumenta que, se fosse possível o ajuizamento de interdito
proibitório no caso concreto, serviria apenas para assegurar a posse dos
prédios das empresas, tendo sido concedido no ato coator um efeito mais amplo.
Sustenta que a existência de um despacho que não decretou a ilegalidade da
greve e, sim, apenas estatuiu a abusividade do fato de não se cumprir com uma
medida liminar, não pode servir de fundamento à decisão aqui atacada. Ressalta
que a ilegalidade ou não da greve será julgada em 17 de fevereiro, podendo o
Tribunal até lá rever sua decisão precária de considerar a greve ou determinada
prática dos grevistas como abusiva. Assevera que a categoria estará reunida na
tarde da próxima segunda-feira, cabendo à assembleia definir os rumos da greve.
Informa que o sindicato já anunciou que pedirá o fim do movimento paredista e
que o comando da greve defende aguardar o julgamento do dia 17. Diz que, assim,
permitir o uso da força policial contra os trabalhadores no dia de sua reunião
mais importante, em nada ajuda para a solução do problema, além de perturbar a
ordem ao invés de impedir dita perturbação. Conclui, por fim, ter demonstrado
amplamente o fumus boni iuris e, quanto ao periculum in mora diz se expressar
no fato de que o cumprimento da ordem impugnada na segunda-feira pela manhã
pode levar a uma espiral de violência incontrolável. Requer a concessão de
medida liminar para cassar o ato atacado ou, sucessivamente, suspender seus
efeitos até a conclusão da assembleia de segunda-feira.
Examino.
A greve é um legítimo direito potestativo da categoria
profissional, cujo exercício pressupõe a liberdade de trabalho e de
convencimento dos trabalhadores à adesão ao movimento paredista, bem assim, do
restante da sociedade que, em última análise, também se beneficia com eventual
conquista que atenue as desigualdades sociais, em especial a de classes. Nesse
sentido, o disposto no artigo 6º, inciso I, da Lei 7.783/89 que assegura aos
grevistas, dentre outros direitos, "o emprego de meios pacíficos tendentes
a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve".
Os piquetes são o cerne da controvérsia e do qual decorrem todas
as repercussões definidas no ato coator (multa e utilização de força policial).
Todavia, como antes se definiu, os piquetes são instrumentos legítimos de
convencimento na adesão à greve. Nesse ponto, conquanto não se configure a
alegada incompetência do juízo para o exame do interdito proibitório, não se
pode olvidar que o movimento paredista em questão é objeto de análise em duas
outras ações (dissídio coletivo de greve e ação cautelar intentada pelo
Município de Porto Alegre) em que houve já definição acerca de percentuais da
frota a serem colocados nas ruas e as repercussões em caso de descumprimento,
bem assim acerca da inviabilidade de se determinar o uso da força policial.
Assim, pretensões no sentido daquelas formulados na demanda subjacente seriam
melhor examinadas nos autos das ações já em curso.
Há que levar em conta, ainda, haver o impetrante protocolado
requerimento de nova reunião de mediação (ID 274139) de sorte que a utilização
de força policial mais que contribuir para uma solução negociada do conflito
coletivo, pode ao revés, acirrar os ânimos.
Defiro, portanto, o pedido liminar para cassar a decisão que nos
autos do interdito proibitório n. 020130-57.2014.5.04.0010, determinou "a
suspensão da prática de todos os atos que estão a molestar a posse legítima das
empresas representadas pelo autor, com a retirada dos piquetes das
portas/portões das garagens das empresas de ônibus, de modo a permitir a saída
dos ônibus das garagens, no prazo de 48 horas a contar da intimação desta
decisão, sob pena de, se necessário for, ser determinada a utilização de força
policial para assegurar o direito das empresas representadas pelo autor e o
respeito à ordem jurídica" e que fixou multa para o caso de
descumprimento.
Intime-se o impetrante e oficie-se à autoridade dita coatora
acerca da presente decisão.
Após, encaminhe-se o feito à regular distribuição.
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